Quando a minha mãe morreu eu tinha 9 anos de idade. Meu tio me disse: os anjos levaram sua mãe para o céu. Eu demorei alguns segundos para entender, imaginei uns anjos dando as mãos para a mamãe que subia levemente. Caí sentada na cama. Fiquei anestesiada durante alguns dias e em depressão durante anos. Era o meu primeiro e mais forte amor que se foi, mas que se despediu. Na noite anterior ela veio no meu sonho e disse que me amava muito.
Primeira amputação.
Quando a minha avó paterna morreu, eu tinha 16 anos, meu pai me ligou e disse num tom levemente desesperado: Camila, a vovó morreu. Minha reação foi fria. Desliguei o telefone e ficou por isso mesmo. Mas não me saía da cabeça a última vez que liguei para ela.
Quando o meu pai morreu, eu tinha 17 anos. Minha tia me deu a notícia como quem fala para fechar as janelas porque que tá chovendo lá fora. Acho que nem chorei. No dia seguinte na hora do almoço eu sentei a mesa para almoçar com o meu tio e comecei a chorar. Ele me disse para parar de chorar porque meu pai era ele. Limpei meu nariz com o guardanapo da mesa e nunca mais chorei.
Quando meu tio morreu, fazia um mês da morte do meu pai. Ele estava em Paris com a minha tia, e eu estava na praça da cidade onde fui criada, o caseiro foi me buscar mais cedo do que tinha marcado, achei estranho e já desconfiei. Fiquei morrendo de medo de que tivesse caído o avião e os dois tivessem morrido. Quando cheguei em casa soube que ele tinha tido um enfarte fulminante, minha tia traria o corpo no vôo do dia seguinte. Aliviada por minha tia, anestesiada por aquele que disse que era meu pai.
Hoje eu tenho 31 anos.
Minha tia me ligou e disse calmamente que a minha avó, a mãe da minha mãe, a Mimi tinha morrido.
Eu não tenho mais 9 anos, eu tenho 31 anos, ela 87. Ela queria chegar pelo menos aos 88 anos. A última vez que a vi ela estava no hospital, desde que acordou dizia para todos que era seu aniversário, me confundia com a minha mãe, me disse coisas horrorosas, tirou a sonda quando fui ao banheiro limpar o nariz de tanto chorar. Depois a vi amarrada na cama cuspindo sangue enquanto dizia que a culpa era minha, toda minha. E eu limpava a sua boca.
Anteontem sonhei que ela estava parecendo a Rainha Elizabeth, bem branquinha, com o cabelo castanho bem forte.
Ela disse: você sabe porquê.
Ela disse: você sabe porquê.
“E hoje em dia como é que se diz eu te amo?”
Camila, essa vida não é fácil. A gente tem tantas perdas, tantos danos irreversíveis. Só a gente sabe o que se passa por dentro da gente. Muitas vezes precisamos, além de simplesmente viver, sobreviver. Sempre admirei você, e esse respeito só aumenta quando vejo a forma como expõe tudo isso. Não poderia ser mais humano. Se precisar de mim, eu estarei por perto. Um beijo... Danielle.
ResponderExcluirQUANDO A LAGARTA PENSOU QUE O MUNDO HAVIA ACABADO,ELA VIROU BORBOLETA!!!
ResponderExcluirOi Danielle, muito obrigada. Também é muito bom saber que está sempre por perto, mesmo longe. Beijo grande.
ResponderExcluirGaroto Perdido, é isso aí. Viro borboleta sempre!